Carro chinês que ignora barreiras
Ficou para trás o tempo em que carro chinês era sinônimo de desconfiança no mercado brasileiro. Ao menos é o que indicam os números obtidos por aqui pela Caoa Cherry. De janeiro a outubro, a companhia emplacou 32,3 mil automóveis, praticamente o dobro da gigante Ford, com 16,4 mil, segundo dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). Em 2022, uma nova marca asiática chegará ao País para disputar a preferência do consumidor. A Great Wall Motors mira atingir até 2022 a montagem anual de 80 mil unidades. “Provavelmente em 2025 teremos 2,7 milhões de unidades produzidas no País. Então, 80 mil não é uma pretensão absurda com relação à marketshare. É uma reação em cadeia”, afirmou à DINHEIRO Pedro Bentancourt, diretor de relações governamentais da GWM.
A empresa chinesa deve finalizar este mês o processo de aquisição da fábrica da Mercedes-Benz em Iracemápolis, interior de São Paulo. Com investimento inicial de R$ 4 bilhões, pretende quintuplicar a capacidade de produção da planta interiorana, atualmente de 20 mil unidades por ano. A fábrica tem área total de 1,2 milhão de m2. “Serão quatro fábricas em uma”, disse Bentancourt, funcionário número 1 da GWM no Brasil e responsável por todos os trâmites para implantação da montadora no País. Quando estiver em plena atividade, a companhia deverá empregar direta e indiretamente 2,5 mil pessoas.
A empresa adquiriu apenas ativos físicos da Mercedes-Benz. Não estão inclusas licenças, o que tem obrigado o executivo a se desdobrar em meio à burocracia no Brasil. “Às vezes, algumas coisas simplesmente não avançam”, disse Bentancourt, que prevê para o período entre 13 e 17 deste mês a transferência das instalações da montadora alemã para a chinesa. “Tivemos de começar do zero e ainda faltam detalhes a acertar.” A inauguração da planta da GWM deve ocorrer no fim de janeiro de 2022.
“Em 2025, teremos a produção de 2,7 milhões de unidades no Brasil. Então, começar com 80 mil não é uma pretensão absurda” Pedro Bentancourt diretor da GWM.
A expansão da capacidade produtiva está apoiada em tecnologias. Segundo ele, a GWM planeja investir globalmente US$ 100 milhões em “tecnologias limpas e alternativas, além de chips de terceira e quarta gerações baseados em carbureto de silício, fundindo hardware e software em um mesmo equipamento”. A ideia, de acordo com o executivo, é introduzir conceitos avançados de produção, gestão de qualidade e proteção ambiental para atender tanto o mercado brasileiro como os demais da América do Sul e do Norte, além da América Latina. A empresa possui uma linha de montagem no Equador e comercializa modelos em outros países da região, como Argentina, Chile, Peru e Uruguai. Pelo mundo são quatro fábricas na China, Índia, Rússia e Tailândia.
A companhia tem cinco submarcas na China: GWM, Haval, Ora, Tank e Wey. O portfólio de produtos para os consumidores brasileiros incluirá carros a combustão, híbridos e 100% elétricos. Até o fim de 2022, a Great Wall Motors comercializará exclusivamente automóveis importados. A definição dos modelos é discutida pela diretoria na China, mas é certo que um SUV da Haval — Jolion e H6 são cotados — estará entre os escolhidos, além de uma picape da própria GWM. A estratégia é entrar no Brasil com carros híbridos. As unidades fabricadas no País sairão das linhas de produção em 2023. Bentancourt destacou ainda a necessidade de montagem de uma rede de concessionárias.
As condições econômicas do País, com alta da inflação e da taxa dos juros e a consequente perda de poder aquisitivo por parte da população, são minimizadas. O executivo não acredita que a situação possa afetar os planos de atuação da montadora por aqui. Segundo ele, as conjunturas econômicas não afetam a operação da GWM no Brasil. “O plano é nos estabelecer, crescer, trazer inovação.” Bentancourt vê como principais desafios mostrar ao consumidor que a empresa tem produtos de primeira linha, além de criar uma relação harmoniosa com o mercado, fornecedores e trabalhadores.
Apesar de a GWM ser a quinta principal montadora da China e o Brasil ser um suporte para exportação de veículos à América do Sul, o especialista Flavio Vasques, consultor da Damato Marketing Automotivo, empresa que trabalha com solução 360º fazendo parcerias e construindo cases com montadoras, não enxerga vida fácil para a companhia. “Além do alto investimento, o payback é muito longo, muito demorado. Um ciclo que o Brasil, nas condições atuais, não vai pagar a conta.”
Por Angelo Verotti – IstoÉ Dinheiro