Um povo maior que seu presidente

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Foto Field Engineer

O Brasil não é só Bolsonaro

Nos últimos 12 anos, por três vezes o Brasil foi tema de uma reportagem especial da Economist, a principal revista de negócios do mundo. Na primeira vez, a previsão se mostrou errada: em 2009, o Cristo na capa alçava voo como um foguete. O Brasil decola era a manchete – a ascensão do país a uma potência mundial política e econômica parecia possível na época, embora, como sabemos, isso não tenha acontecido.

A segunda previsão foi profética. Em 2013, o Cristo aparecia se desintegrando na capa. “O Brasil estragou tudo?”, perguntava a Economist. Isso se revelou uma sábia previsão. Na época, o verdadeiro colapso do país em tal magnitude não poderia ser previsto. A manchete na capa mais recente é A década sombria do Brasil. O Cristo recebe ventilação artificial. E é realmente um quadro extremamente sombrio o que a Economist pinta ao longo de dez páginas, sem ousar fazer uma previsão desta vez. O título da reportagem diz tudo: À beira do abismo.

O surpreendente nesta análise é que a Economist, como publicação de referência do capitalismo liberal e da economia global, geralmente coloca a economia no centro de sua análise – para depois explicar as influências sociais, políticas ou tecnológicas que fazem com que um país não cresça, por exemplo.

Presidente Bolsonaro fala na abertura da 74ª Assembleia Geral da ONU, em Nova York. Foto Alan Santos

No caso do Brasil, desta vez é diferente. A correspondente Sarah Maslin descreve os desafios assustadores da estagnação econômica, polarização política, degradação ambiental, regressão social e o pesadelo da covid-19. No texto, ela argumenta principalmente em termos políticos.

Ela vê o presidente Jair Bolsonaro como o culpado e a principal razão da pior crise do Brasil desde 1985, quando o país voltou à democracia. Bolsonaro, diz ela, não está interessado em reformas: ele quer destruir as instituições. “Antes da pandemia, o Brasil estava sofrendo numa década com problemas políticos e econômicos. Com Bolsonaro como seu médico, agora está em coma.”

Economist adverte sobre os graves danos que o Brasil enfrentará se Bolsonaro permanecer na presidência por mais quatro anos. O risco é real: 30% dos brasileiros apoiam a política populista de direita.

Tudo isso é verdade. Ainda assim, é importante não esquecer: o Brasil não é apenas Bolsonaro. Trinta por cento dos brasileiros é muito, mas são uma minoria. O Brasil tem uma sociedade civil ativa, um Judiciário pronto para se defender, apesar de todas as suas falhas, e uma mídia vigilante. Tem negócios inovadores, mercados financeiros sólidos, sua própria base industrial. O Brasil tem uma vibrante cultura de startups, ao lado de produtores de commodities e energia que são líderes mundiais. A sociedade é jovem, há uma classe média. O país possui meia dúzia de centros políticos e econômicos.

Minha previsão, portanto, é que o Brasil também pode sobreviver a Bolsonaro. Mesmo que mais quatro anos possam causar danos irreparáveis ao país, por exemplo, no meio ambiente, educação ou pesquisa e desenvolvimento. Sem mencionar os danos sociais.

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Que Ele nos mostre o caminho certo. Foto Lefter D

De minha parte, assino embaixo da conclusão da Economist: será difícil mudar o rumo do Brasil enquanto Bolsonaro for presidente. A prioridade mais urgente é derrotá-lo nas urnas.

A isso, não há mais nada a acrescentar.

Por Alexander Busch – DW.com

Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.