Quer deixar o emprego e virar empreendedora? Antes, veja essas dicas

As brasileiras que empreendem chegam a 30 milhões, de acordo com dados do Global Entrepreneurship Monitor

As buscas no Google por “como iniciar um negócio” superaram “como conseguir um emprego” em 2021, de acordo com os dados da retrospectiva “Year in Search” da plataforma. A mudança é mais um dado na dinâmica de migração dos empregos formais para empreender, seja por vontade ou necessidade, que foi reforçada durante a pandemia.

Ainda que grande parte dos novos negócios tenham nascido por conta do desemprego, há também um movimento entre as mulheres que procuram maior flexibilidade de tempo, ganhos mais altos ou querem colocar em prática seu propósito.

Nós conversamos com seis empreendedoras que fizeram essa mudança e hoje estão no comando das suas companhias. Aqui, elas contam suas experiências em cada fase do negócio. Saiba quem são e o que viveram a cada passo dessa trajetória.

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Foto Anna Shvets

Ilana Nasser era diretora de engajamento de rede da Endeavor, mas fez uma transição para fundar a Vendah, startup que engaja mulheres a conseguir uma renda extra revendendo produtos em regiões periféricas. Hoje, a empresa tem em torno de mil revendedoras ativas e, em março deste ano, captou R$ 8 milhões para expandir sua operação.

Paula Crespi e Flávia Deutsch também deixaram cargos e projetos em empresas e fundaram a Theia, femtech de atendimento a gestantes que acaba de receber um aporte de R$ 30 milhões. Especialistas multidisciplinares acompanham a mulher desde o período em que ela deseja engravidar até o pós-parto, em consultas presenciais e virtuais, por meio de uma plataforma e aplicativo.

Clariza Roza saiu de uma agência de comunicação para criar a sua própria, a SILVA, com foco em profissionais negros e periféricos.

Marcella Zambardino, designer de formação, deixou projetos para abrir a Positiv.a, empresa de materiais sustentáveis de higiene e limpeza, que surgiu de um movimento de questionar tudo o que consumia e levava para dentro de casa. No primeiro trimestre deste ano, a empresa vendeu mais de 18 mil produtos, que podem ser encontrados em lojas e supermercados de 27 municípios brasileiros, além do e-commerce da marca.

Claudia Alcantara, da Cadiveu. Foto Arquivo Pessoal

Claudia Alcantara, fundadora da marca de produtos de cabelo Cadiveu, começou a empreender produzindo apostilas virtuais com informações sobre tratamentos de cabelo. Quando percebeu, já tinha um produto nas mãos, e ganhava mais com a venda das apostilas do que com o trabalho que tinha à época, com carteira assinada.

Como ter uma ideia

Flávia Deutsch, da Theia: “Não é tomando banho que vem uma luz e você tem uma ideia brilhante. Isso vem de disciplina, metodologia e resiliência. Não adianta apenas ter uma ideia que você amou. Tem que analisar qual problema você quer resolver e, a partir dele, concentrar em possíveis soluções.”

A Theia tem como objetivo fornecer um atendimento de saúde humanizado em que as mulheres façam parte das decisões. As sócias sentiram dificuldade nesse acompanhamento quando tiveram seus primeiros filhos e decidiram criar a empresa a partir de experiências próprias.

Ilana Nasser, da Vendah: “Enquanto você não estiver resolvendo um problema real, não faz sentido e o mercado não vai responder ao seu negócio.”

A Vendah quer democratizar o e-commerce em regiões periféricas e ajudar mulheres sem recursos a ganhar uma renda extra.

Como se preparar financeiramente

Ilana, da Vendah: “Eu tinha um salário de diretora e deixei de ter qualquer receita por um tempo, então tive que me organizar e fazer algumas adaptações. Foi um período desconfortável financeiramente, cheguei a me mudar e dividir casa com outra pessoa para diminuir os custos.”

Flávia, da Theia: “Foi uma decisão muito pensada. A gente se preocupou em montar um colchão financeiro para conseguir ganhar tempo até ter algum tipo de retorno financeiro.”

Ter um sócio é importante?

Marcella Zambardino, da Positiv.a: “Vale a pena ter um sócio se vocês tiverem conhecimentos complementares, porque uma sociedade pede essa complementaridade.” Ela fundou a Positiv.a em sociedade com dois homens.

Pesquise o mercado

Marcella, da Positiv.a: “Mercados grandes, de produtos básicos e necessários, como alimentação, higiene e limpeza, independem de crises, mas têm padrões antiquados. A minha recomendação para quem quer começar um negócio é pesquisar empresas que já estão com práticas responsáveis e ter um olhar de cuidado com o planeta e responsabilidade com as pessoas. Assim, a gente consegue inovar em espaços que as grandes multinacionais ainda têm insegurança.”

Conte sua ideia para o mundo

Clariza Rosa, da Silva. Foto Arquivo Pessoal

Paula Crespi, da Theia: “A primeira coisa que a gente fez foi conversar com amigos que tinham histórias de sucesso para entender o que funcionou e o que não funcionou. A gente se cercou de pessoas excelentes e vimos as metodologias que eles aplicaram. Assim, você consegue pular etapas e não precisa repetir o erros dos outros.” A experiência das fundadoras da Theia também mostra que os relacionamentos prévios são importantes na hora de levantar investimento.

Clariza Roza, da SILVA: “A conexão com outras mulheres que estão passando pelo mesmo processo ou que podem ser aliadas ao longo do caminho foi fundamental para mim. Eu comecei meu negócio ao lado de homens que me deram muito suporte, mas é muito diferente quando você consegue trocar com mulheres que entendem exatamente qual é a sua dor. Também foi importante ver mulheres negras no mercado, líderes e ocupando espaços.”

Pesquise potenciais clientes

Ilana, da Vendah: “É muito importante conversar com potenciais clientes, as pessoas que vivem o problema que você quer resolver e que seriam atingidas pelo negócio para entender com profundidade a situação delas e como ajudá-las.”

Clariza, da SILVA: “A gente entrou em contato com muitas empresas e pedimos para que elas também nos indicassem e nos conectassem com grandes marcas. É importante ter uma rede poderosa para te ajudar a atingir os objetivos.”

Como levantar investimento

Flávia, da Theia: “A gente não é muito padrão porque a primeira rodada foi bem rápida comparado ao mercado. A gente teve o privilégio de já estar inserida no meio, ter relacionamento com fundos e ter uma estratégia de manter uma relação com os investidores no momento em que a gente ainda estava explorando o que a gente queria fazer, uns quatro meses antes de levantar o dinheiro.”

Clariza, da SILVA: “Até hoje a gente não recebeu investimento nenhum. O nosso investimento foi literalmente muito trabalho e tempo. A gente passou muito tempo trabalhando em lugares diferentes até que as lideranças da empresa conseguissem trabalhar só na SILVA, e essa é a realidade de muitas pessoas para conseguir colocar o seu negócio de pé.”

Comece com o mínimo

Claudia Alcantara, da Cadiveu: “Você tem que pensar em como você pode começar agora. O que dá para fazer hoje? Qual o produto mínimo viável (MVP)? Você pode começar com o WhatsApp, com uma landing page grátis na internet, já começa a desenvolver pequenos clientes e vai crescendo aos poucos. Talvez você não saiba para onde vai, mas tenha a coragem de começar pequeno.” A Cadiveu começou com pequenas vendas de produtos de cabelo em 2007 e hoje está presente em 80 países.

Clariza, da SILVA: “Quando a gente começou, a gente não tinha contato direto com grandes marcas, elas serviam como uma ponte para a gente conseguir pegar alguns projetos. Isso fez com que a gente conseguisse se conectar com essas marcas e hoje a gente já trabalha diretamente com elas.” Hoje, a SILVA tem Twitter Brasil, Netflix e Coca-Cola entre seus clientes.

Seja transparente ao se desligar da empresa

Ilana, da Vendah: “Eu fui muito leal à Endeavor e avisei com meses de antecedência que aquele seria meu último ano. Eu foquei muito em trazer uma sucessão e garantir a gestão do conhecimento para passar os meus aprendizados de oito anos na empresa.” Ela chegou a conciliar por alguns meses seu cargo de diretoria na Endeavor e o desenvolvimento da sua empresa, mas acredita que o momento de pedir demissão é muito pessoal.

Não tenha medo do julgamento

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Foto Alexander Suhorucov

Clariza, da SILVA: “Os homens se sentem muito mais confortáveis com as coisas que eles não dominam, e as mulheres, de uma maneira geral, tendem a dizer que fazem alguma coisa só quando têm muito domínio sobre aquilo. As mulheres precisam ter uma certa coragem, ousadia e até cara de pau de chegar nos lugares e dizer o que fazem – e talvez nem saibam fazer ainda, mas vão conseguir entregar aquilo. Isso é muito importante para a gente alcançar lugares que não são dados a nós.”

Ilana, da Vendah: “Eu estava numa posição ótima, era super reconhecida, mas decidi sair. Muita gente vai te achar doida, e tudo bem, faz parte. Não deixe as inseguranças dos outros serem projetadas em você. Você tem que se conhecer e entender que esse é o seu caminho e as pessoas vão pensar diferente mesmo.”

Paula, da Theia: “Como mulher, exige um esforço a mais de pensar ‘eu não me enxergo naquele meio, mas eu vou me colocar lá’. Isso causa receio, mas quando você vai, você vê que é tão capaz quanto os outros.”

Por Forbes Brasil