Montar um negócio pensando mais no resultado financeiro do que no trabalho pode gerar frustração
Há alguns anos, um entrevistado me disse: “Empreender, para mim, é trabalhar, ralar. Mas vejo um monte de gente agora dizendo que é empreendedor, com uma apresentação em Powerpoint debaixo do braço, procurando investidor para financiar sua ideia”. Mais recentemente, outro entrevistado me falou sua visão sobre a diferença entre ser empreendedor e ser empresário. “O empreendedor, para mim, é aquele que está sempre querendo um investidor, quer abrir capital, criar uma história para vender a empresa. Já o empresário fala: ‘Essa empresa é minha, ela vai crescer e pode se tornar a maior do mundo.’”
Outro ainda — Henrique Dubugras, co-fundador da Brex, para o livro Fora da Curva – unicórnios e startups de sucesso — afirmou: “Não vamos vender essa empresa nunca, nem se tivermos uma oferta de US$ 10 bilhões. Temos 23 anos, se vendermos vamos fazer o quê? Investir? Eu não gosto de investir. Ir para a praia? Passo um ano lá. Abrir outra empresa? Eu gosto dessa, para que vou abrir outra?”
Concordo com ele e, pela definição anterior, me sinto mais empresária. Não fundei minha empresa pensando em vendê-la (mesmo que um dia eu enxergue motivos e decida fazer isso). Criei um negócio para ter a vida que eu sonhava ter — hoje, não no futuro —, para contribuir com a sociedade com a parte que me cabe. Para realizar e me realizar.
Se você está querendo empreender, sugiro refletir antes sobre alguns pontos.
Questione-se. Será que você realmente quer isso da vida?
Se o objetivo, antes de a empresa começar, já é vendê-la em alguns anos; se o status de CEO (ou qualquer outro nome bonito) lhe encanta mais do que o trabalho que você vai ter para colocar o negócio de pé (trabalho não só de um CEO, mas também de estagiário e todas as funções entre um e outro), ou se o lucro financeiro é seu principal objetivo, talvez melhor repensar. Empreender é resolver problemas do começo ao fim dos dias e gostar disso independentemente de quais sejam os resultados e de quando eles virão.
Não tome decisões radicais sem experimentar pequeno antes
Como diz uma cliente, “empreender é sempre um ato de loucura”, mas se fizer loucura demais o negócio pode não vingar. Achar a medida do risco, do erro saudável, é difícil. Então, o melhor conselho acredito que seja: arrisque com pouco em jogo — só aquilo que você pode perder. Menos é mais.
Primeiro comece a fazer, depois planeje
Para negócios que não precisam de grandes investimentos inicialmente, faça primeiro, trabalhe no Powerpoint depois. É mais fácil criar uma narrativa sobre a realidade do que tentar ajustar a realidade à narrativa criada. Se você não precisa de um escritório, por mais sedutor que pareça ter um, calma. Tudo a seu tempo. Algumas pessoas me aconselharam a investir em um maior do que o caixa me permitia, com argumentos como “pega bem com os clientes”, “importante ter um lugar com a sua cara para criar cultura”. Mas nada disso tem valor se não houver algo sólido para oferecer. Ocupe-se construindo o essencial e invista no restante com o tempo. Para mim, nada vale o sossego de um negócio auto sustentável desde o início.
Pense
Pode parecer óbvio e trivial, mas tenho aprendido que não é. Muitas vezes, a gente sai fazendo sem refletir. Com tantos estímulos e possibilidades no mundo de hoje, e ainda mais nos primeiros anos de um empreendimento, é fácil entrar no automático. Mas reservar tempo na agenda para pensar, elaborar, ter espaço, respiro para ver as coisas de outro ângulo, com profundidade, é fundamental para qualquer vida e negócio.
Invista no autoconhecimento
Partindo disso, tudo acontece de maneira mais harmônica. Se souber os seus reais motivos para empreender, se conhecer seus pontos fortes e o que precisa desenvolver, o que tem disposição ou não para fazer, terá um ponto de partida para seus questionamentos e uma âncora para tomar decisões.
Empreender é um verbo, implica ação constante, movimento. Se o topo da montanha lhe empolga mais do que a superação da subida, não há nada de errado com isso. Só talvez seja melhor buscar outro esporte em vez de empreender.
Por Ariane Abdallah – Forbes Brasil
Jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo”, co-organizadora do “Fora da Curva 3 – unicórnios e start-ups de sucesso” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional. Praticante de ashtanga vinyasa yoga, considera o autoconhecimento a base do empreendedorismo.
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