Estatuto da Criança e do Adolescente: por que o Brasil avançou pouco nessa agenda?

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Para Andrea Moreira, a violência contra a criança e adolescente persiste e cabe à sociedade civil e governos atuarem para reduzir os danos atuais

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é umas das legislações brasileiras mais reconhecidas fora do Brasil assegura a proteção e direito deles, completa 33 anos no próximo dia 13. Criado por meio da Lei 8.069/90, o Estatuto reconheceu o público infantojuvenil como sujeito de direitos e determinou que é dever do Estado, da família e da sociedade assegurar às crianças e adolescentes o direito à vida, educação, cultura, esporte, convivência familiar e social, acesso à profissionalização e salvaguardá-los de toda e qualquer violência seja física, mental, emocional e negligência

Ao longo dessas três décadas, muita coisa foi feita na área das políticas públicas. Há avanços e melhoras, no entanto, há muito a ser feito tanto pelos governos Federal, Estaduais e municipais no que tange a estruturação de serviços, acesso, oportunidades e inovação, quanto pela sociedade em especial às organizações sociais que atuam na promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, responsáveis pela execução de projetos sociais que precisam atender as necessidades atuais da sociedade. Para Andrea Moreira, CEO da Yabá Consultoria, especializada em ESG para projetos de impacto social nas áreas de saúde, cultura e educação, o ECA é uma das legislações mais modernas do mundo.

“É a lei que regulamentou os direitos do público infanto-juvenil brasileiro e expressou as diretrizes que estabelecem as crianças e os adolescentes como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, detentoras de todos os direitos aplicáveis à sua idade. Além disso, é um instrumento político que fortalece a democracia e convoca a participação ativa da sociedade civil organizada”.

Andrea Moreira, CEO da Yabá Consultoria. Divulgação

O Estatuto da Criança e do Adolescente reconhece os direitos do público infanto-juvenil, e também dispõe de mecanismos fundamentais para o fortalecimento das políticas públicas e incentivos fiscais.

A Lei preconiza que as empresas podem destinar 1% do Imposto de Renda para os Fundos dos Direitos da Criança e do adolescente contas bancárias que são geridas pelos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, instâncias paritárias (50% dos representantes são indicados pelo poder público) e os outros 50% são eleitos e representam as organizações sociais com o propósito de de propor políticas públicas locais, realizar diagnóstico socioterritorial para compreender a realidade da população alvo e produzir planos de ação e conscientização para melhorar a qualidade de vida das crianças, adolescentes e suas famílias seja na área de assitência social, cultural, educacional, profissional , saúde e meio ambiente.

Abrangência da pobreza

Prefeitura de Campo Grande desenvolve ações efetivas para proteger crianças e adolescentes. Foto Canva Studio. Divulgação PMCG

A pobreza, dificuldade de acesso à educação, violência doméstica, racismo, discriminação, entre tantos outros problemas, ainda são realidade no mundo de muitas crianças e adolescentes, mesmo com o avanço de práticas ESG – no caso, do S (Social). De acordo com a pesquisa ‘As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil’, feita pela Unicef, pelo menos 32 milhões de crianças e adolescentes estão na pobreza – o que representa 63% do volume total.

De acordo com o levantamento, a pobreza envolve várias dimensões incluindo renda, alimentação, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação. Além disso, aponta que essa condição inclui aspectos como estar fora da escola, viver em moradias precárias, não ter acesso à água e saneamento, alimentação adequada, à informação e ter que se submeter ao trabalho infantil.

Segundo Andrea, é preciso investir mais no bem-estar das crianças e adolescentes, reforçar as políticas sociais, que sejam colocadas em prática de forma planejada e estruturada, com foco nos resultados.

Em 2021, conforme o relatório da Unicef, o porcentual de crianças e adolescentes que viviam com renda abaixo da linha de pobreza monetária extrema atingiu o nível mais alto dos últimos cinco anos: 16,1%. Já o volume de menores privados da renda adequada para ter acesso a uma alimentação adequada saltou 40% – de 9,8 milhões em 2020 para 13,7 milhões no ano seguinte.

Falhas nas políticas educacionais

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A falta de acesso à educação por parte das crianças e dos adolescentes é um dos pontos que também registrou poucos avanços e alguns retrocessos. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) realizada pelo IBGE, no período entre 2019 e 2022, 5,6% da população do país (9,6 milhões de pessoas) com 15 anos ou mais não sabiam ler ou escrever.

As empresas têm poder de contribuição efetiva à promoção dos direitos da criança e do adolescente. Ao destinar recursos dedutíveis do Imposto de Renda para os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente e estimular iniciativas de inovação educativa com tecnologia para ampliar o acesso à educação, bem como, às novas tecnologias. Os projetos sociais, de acordo com Andrea, podem ser incubadores de políticas públicas, é necessário desenvolver, testar e ampliar as ações em cidades pequenas e depois dar escola para os municípios maiores, haja vista, que o Brasil tem dimensões continentais e é necessário compreender e respeitar a cultura local e as potencialidades dessa cultura. Essa reflexão e conexão das empresas faz sentido com os conceitos de ESG, a lógica da gestão socioambiental e governança das empresas, bem como, articulação com suas estratégias de negócio pensando em longo prazo.

Durante a pandemia, apenas em 2021 houve uma queda de 275 mil matrículas no ensino infantil. O Censo Escolar 2022 refutou esse fato: mais de 1 milhão de crianças e adolescentes entre 4 e 17 anos estavam fora da escola.

Acesso para todos

Para Andrea, as empresas, pessoas, organizações sociais e governamentais, ao assumirem um compromisso político-social efetivo, podem transformar a dura realidade que vivem as crianças e adolescentes, em sua grande maioria, no Brasil.

“Daí a importância de apoiar e fortalecer os Conselhos de Direito da Criança e do Adolescente para que possam atuar de maneira ativa e com qualidade como articuladores sociais, gestores dos Fundos Municipais dos Direitos e propositores de políticas públicas. Dessa forma, poderão garantir dignidade e absoluta prioridade aos direitos de milhares de brasileirinhos que crescem junto com o Brasil e que, como nós, terão o dever de ajudar na construção de um país mais justo e sustentável para todos”, conclui.

Por Fernanda Ribeiro