Entenda por que é mais difícil diagnosticar câncer de mama na gravidez
Ouvir a primeira batidinha do coração do bebê, descobrir o sexo e vê-lo crescer diariamente são momentos preciosos da gravidez e focados no pequeno que está a caminho. Mas e o monitoramento do corpo da mãe? Aqui, não estamos falando sobre ganho de peso ou outro tipo de pressão social que ronda a imagem das figuras femininas. O diálogo é mais profundo e necessário: o câncer de mama é a doença que mais mata mulheres e ele pode acontecer durante a gravidez.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer, 2,3 milhões de mulheres ao redor do mundo descobriram um câncer de mama em 2020. Em 2021, no Brasil, o número é menor, mas ainda preocupante: a estimativa é que 66.280 figuras femininas foram diagnosticadas com a doença, sendo 61 laudos positivos a cada 100 mil pacientes. Com as subnotificações, o cenário pode ficar mais alarmante, como mostra o estudo “Câncer de mama: tabu, falta de clareza sobre a doença, diagnóstico precoce e autocuidado”.
Realizado pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec) a pedido da Pfizer, constatou-se que 47% das 1.400 brasileiras que participaram do estudo deixaram de frequentar o ginecologista e o mastologista neste ano e, consequentemente, terem um quadro oncológico descoberto e acompanhado.
Durante a gravidez, a incidência da doença é mais rara, acometendo uma gestante a cada 3.000. Só que a preocupação é o diagnóstico desafiador e tardio do câncer de mama neste período, levando a complicações irreversíveis, sendo que ele poderia ser tratado ainda durante os nove meses e sem afetar o bebê que está a caminho.
Por que é difícil descobrir câncer de mama na gestação
O mastologista Marcelo Bello, diretor do INCA III, explica que a ausência de investigação e possível laudo da doença durante a gestação começa pela idade da paciente. “Normalmente, engravida-se em uma faixa etária (em torno dos 30 anos) em que o câncer de mama não é incidente”, relata. Isso faz com que não se tenha a indicação do exame de rastreio nesta idade e, consequentemente, a descoberta da doença pode ser tardia.
As mudanças naturais dos seios ao longo dos nove meses também podem fazer com que seja mais difícil perceber uma irregularidade nas mamas. Como lembra Bello, é esperado que a região sofra os efeitos dos hormônios, com o tecido mamário amplificando, ganhando mais volume e até mesmo acumulando mais líquido. Mas o que não pode acontecer é a grávida notar o aparecimento de nódulos e não informar seu médico.
“A maioria das gestantes com câncer de mama vão apresentar um espessamento ou massa palpável na mama. Normalmente, quando ela persiste por mais de duas semanas deve ser investigada, apesar de que a grande maioria vai se mostrar benigna”, esclarece Levon Badiglian Filho, ginecologista oncologista do A.C. Camargo Câncer Center.
O especialista também pontua que quadros secundários, como mastite, abcessos e galactoceles (lesões benignas vistas em aleitações novas), também podem ocasionar confusão no diagnóstico e atrasar a descoberta do câncer.
Suspeita exige investigação!
Por medo de expor o bebê que está na barriga à radiação, muitas mulheres acabam evitando exames necessários. Só que, além de serem seguros, a suspeita do câncer de mama só pode ser comprovada por meio das análises.
A mamografia pode ser o primeiro exame a ser pedido, com o cuidado de uma capa de chumbo colocada sobre a barriga da mãe para proteger o bebê. Mas, como explica Bello, a densidade das mamas na gravidez pode fazer com que não seja possível enxergar alguns nódulos presentes na região.
A alternativa apontada pelo médico é a ultrassonografia, que usa outro método de captura de imagem e pode ser mais efetivo no processo de investigação. “A ressonância magnética também pode ser utilizada, sem nenhum problema”, completa o mastologista. Os exames que não são indicados durante a gravidez são de tomografia e pet scan.
É possível começar o tratamento de câncer na gravidez
Após o laudo do câncer de mama, é fundamental que a doença comece a ser tratada, para que regrida o máximo possível. O que será diferente com a gravidez acontecendo simultaneamente é a escolha do método que não colocará a vida da mãe e do bebê em risco.
“Cirurgia, como a mastectomia, pode ser realizada de forma segura. Porém, um tratamento como a radioterapia deve ser adiado até depois do parto, pois pode causar abortamento, má-formação, distúrbios no crescimento e efeitos carcinogênicos”, cita Levon.
Neste caso, Bello cita um exemplo: se o câncer de mama for descoberto no início da gestação e o procedimento cirúrgico for uma opção para removê-lo completamente, a tendência é não fazer uma cirurgia conservadora, porque ela obrigatoriamente exige o complemento da radioterapia e ela não pode ser feita na gravidez. A saída é a mastectomia com reconstrução, por exemplo.
A cirurgia também pode ajudar a atrasar o desenvolvimento do câncer de mama, para que, logo após o parto, a mãe consiga passar pela radioterapia. Em alguns casos, os médicos podem antecipar o nascimento do bebê para quando ele já apresentar maturidade fetal, a fim de que a mãe consiga realizar a intervenção o mais rápido possível.
“Em relação à quimioterapia, o que se sabe é que muitas das drogas usadas em câncer de mama são seguras quando utilizadas após o 1º trimestre de gestação”, completa o ginecologista oncológico.
Portanto, mãe, ao suspeitar de qualquer alteração nos seios, não tenha medo de conversar com o seu médico sobre a possibilidade de ser um câncer de mama, principalmente se houver histórico familiar. Ainda que a gestação seja um momento bonito, doenças podem acontecer e é preciso poder falar abertamente sobre elas. Quanto mais cedo descobertas, maiores as possibilidades de tratamento.
Por Alice Arnoldi – Bebê