Especialistas citam três perfis principais de criadores de fake news. Conheça quais são
São eles: os criadores de conteúdo que ganham dinheiro em redes sociais e sites; os que estão envolvidos com causas políticas por conta de convicção ou dinheiro; e os que criam as mentiras por humor e sátira. Série de vídeos do g1 tira as principais dúvidas das pessoas sobre fake news e dá dicas de como não cair em desinformação.
Nos últimos anos, fake news e desinformação se tornaram assuntos comuns entre os brasileiros. As mensagens falsas sobre máscaras, vacinas e isolamento social se proliferaram durante a pandemia e ganharam dimensões políticas, econômicas e de saúde pública. Esta é uma enxurrada de desinformação que só tem aumentado com a guerra na Ucrânia e a proximidade das eleições em 2022.
Mas de onde surgem estas histórias? Quem são os criadores de fake news e por que eles fazem isso?
Para ajudar a entender as fake news e como combatê-las, o Fato ou Fake lançou no dia 7 de março, no g1 e no YouTube, uma série de vídeos que explicam o que está por trás deste fenômeno. Publicados semanalmente, os episódios mostram também o que fazer para não se tornar uma vítima da desinformação.
Para entender quem são as pessoas que estão por trás das mensagens falsas, o g1 conversou com diversos especialistas para entender o funcionamento das redes sociais e as possíveis motivações por trás da indústria da desinformação.
Segundo os especialistas, as principais motivações dos criadores de fake news costumam ser as seguintes:
- Pessoas que ganham dinheiro com a divulgação das mensagens falsas e distorcidas: o funcionamento das redes sociais e das principais plataformas da internet permite que criadores de conteúdo monetizem posts, textos e vídeos em sites e redes sociais. Como conteúdos falsos costumam apelar para a emoção das pessoas, eles chamam atenção e geram bastante engajamento (cliques, visualizações e compartilhamento). Através deste engajamento, os produtores conseguem ganhar renda por meio de publicidade.
- Pessoas que criam desinformação por convicção política e/ou porque são pagas para isso: são usuários “comuns” de redes sociais que trabalham em empresas ou em campanhas políticas para alimentar discussões, distorcer notícias e espalhar mensagens falsas ou distorcidas. Podem ter diferentes perfis: militantes, que entram no mundo da desinformação apenas por convicção política; pessoas que recebem salários para isso; ou mesmo uma junção dos dois (militantes pagos).
- Trolls e pessoas que criam fake news como forma de piada ou sátira: páginas e perfis humorísticos frequentemente criam histórias fictícias como forma de satirizar algum fato ou pessoa pública. Muitas vezes, estes conteúdos perdem o controle e passam a circular como se fossem verdadeiros nas redes sociais. Além disso, há os “trolls”, que podem criar histórias absurdas apenas para criar confusão e ver o alcance das piadas.
Veja um pouco mais sobre cada um desses perfis a seguir.
Criadores de conteúdo e fake news
Segundo os especialistas, as fake news se transformaram em um verdadeiro negócio nos últimos anos. E um negócio que pode ser bem lucrativo. Isso porque a forma como as redes sociais funcionam tornou a criação e a divulgação de mensagens falsas economicamente rentável. Basicamente, a lógica é: quanto mais cliques e visualizações, maior o retorno.
“A motivação número um é porque é um grande mercado. Ou seja, as pessoas descobriram que, com desinformação, elas podem fazer bastante dinheiro. Tanto que fazem”, diz David Nemer, professor da Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos.
Pablo Ortellado, professor da USP e pesquisador sobre desinformação e política, concorda e explica que o financiamento vem do próprio funcionamento das redes sociais e das grandes plataformas na internet.
“O que a gente sabe? Que existem mecanismos de financiamento que vem das próprias plataformas. No YouTube, o tempo que a pessoa assiste o vídeo e o número de pessoas que assistem [contam]. Quanto mais pessoas assistem, quanto mais tempo elas assistem e são expostas à publicidade, mais o canal é remunerado”, diz Ortellado.
O professor Yurij Castelfranchi, da UFMG, diz que parte dos produtores de conteúdo se tornaram criadores de fake news porque perceberam que espalhar mensagens cheias de teorias de conspiração e mentiras chama a atenção das pessoas e, consequentemente, rende cliques e dinheiro.
“Um vídeo mais sério, que fala a verdade, em muitos casos é menos assustador, menos emocionante e te de deixa menos revoltado [que uma mensagem falsa]. Então, em geral, é menos compartilhado”, diz Castelfranchi.
“Esse é o problema. Seu dinheiro depende de quantas pessoas assistem. É como empurrar as pessoas que produzem conteúdo a produzir conteúdo ruim, no sentido de falso, no sentido que exagera, sensacionaliza”, diz o professor.
O primeiro episódio desta série explicou por que as pessoas acreditam em fake news e falou sobre como as mensagens falsas costumam apelar para a emoção das pessoas.
Fake news e política: militantes e assalariados
Além dos produtores de conteúdo que trabalham de forma independente, Castelfranchi diz que existem pessoas que são pagas para criar desinformação. Ele cita alguns “trolls” como exemplo disso.
Segundo o professor, há uns anos, eram pessoas que apenas gostavam de “trollar” nas redes sociais; ou seja, tudo não passava de uma piada para ver o quanto sua mentira ia se espalhar e até quando iam levá-la a sério. Mas, de um tempo para cá, o negócio de profissionalizou.
“Hoje, existem fazendas de ‘trolls’. São cultivadas equipes muito grandes de pessoas espalhadas pelo mundo para fazer essa ‘trollagem’, para atrair pessoas na armadilha de se odiar ou brigar ou não poder confiar em mais ninguém e não saber o que mais é verdade e o que é mentira”, diz.
“Tem fazenda em que algoritmo e robô trabalham juntos com seres humanos, construindo perfis falsos com o objetivo de fazer uma postagem bonitinha, um gatinho, um bicho fofinho[…]. Depois que as pessoas começam a confiar neste perfil, ele começa a semear outras coisas. Esse é o truque principal. Isso é muito usado na política, mas também por motivos empresariais”, diz Castelfranchi.
No campo da política, além de poder ter dinheiro envolvido, outro fator importante é a ideologia das pessoas. Isso porque tem aqueles que se envolvem na criação e disseminação de fake news por conta das suas convicções políticas, como diz Ortellado.
“O que está acontecendo de maneira geral é que existem fábricas de militantes que tentam alimentar as torcidas dos campos políticos que estão em disputa no país. São vários processos. Um é a produção de conteúdo. Essa produção está ligada a sites, canais e agentes que disseminam notícias em aplicativos de mensagem”, diz Ortellado.
“Além disso, tem as ações dos militantes e dos trolls, que são pessoas que tumultuam o debate político, que entram em comentários e disputas argumentativas e que atrapalham a conversa civil sobre política.”
David Nemer, da Universidade da Virgínia, diz que esta relação entre fake news e política se tornou ainda mais forte depois das eleições de 2018, quando as redes sociais ganharam destaque nas campanhas políticas.
“Eles [políticos e candidatos] descobriram que, por meios digitais, conseguem alcançar pessoas que o horário eleitoral gratuito não alcançaria. E são conteúdos que são mais convincentes, já que fake news trabalham com a emoção das pessoas, então tentam criar comoção para a pessoa acreditar na desinformação e, assim, lutar contra ela”, diz.
Fake news e humor: a piada que perde o controle
O cientista político e professor da UFMG Felipe Nunes dos Santos ainda cita um terceiro grupo de criadores de fake news: aqueles que estão envolvidos com humor e sátiras.
“São os humoristas, o grupo de sátira. É gente que vai usar a fake news muito mais como uma oportunidade de humor. Em geral, esse grupo explicita a construção da fake news, explicita a falsidade do conteúdo, pois o objetivo nesse caso não é manipular a opinião das pessoas para conseguir apoio por conta das fake news, mas usar a sátira para conseguir fazer com que as pessoas prestem atenção em um conteúdo absurdo e talvez reflitam sobre isso”, diz.
O problema é que, em muitos casos, os conteúdos perdem o controle e passam a ser compartilhados como se fossem verdadeiros nas redes sociais.
O que fazer para evitar cair em fake news?
Diante da pandemia da desinformação, uma questão que surge é como não cair nas armadilhas das mensagens falsas que circulam nas redes sociais.
Os especialistas dão uma série de dicas simples. Veja abaixo as principais:
- Procurar informações e opiniões contrárias às nossas: “Você vai votar no candidato 1? Legal. Entra no candidato 2 e vê o que ele está falando também. Tenha contato com informações que são aparentemente incompatíveis, pois isso vai lhe dar uma opinião mais sensata e equilibrada”, diz o psicólogo Cristiano Nabuco, do Instituto de Psiquiatria da USP.
- Reler as informações: “Sempre que eu leio alguma coisa que eu sinto que fiquei muito irritado, que me deixou indignado, eu falo: ‘Opa, estão atuando em cima de mim. Vamos devagar. Vamos ler isso de novo. Será que isso é verdade? Isso que está escrito é factível? Será que, de fato, esse candidato ou essa pessoa falaria isso?'”
- Checar as informações em várias fontes: “Cruzar informações, buscar a origem e ter certeza”, diz Nabuco. “Faça uma leitura lateral. Abra uma aba do lado e pesquise. Será que algum jornal falou isso?”, diz Yurij Castelfranchi, professor da UFMG.
- Jogar um trecho da mensagem em um buscador: “Veja se aquele trecho já aparece em outras fontes. Eu sei que a maioria das pessoas que acredita em fake news não confia nos jornalistas, mas a mídia é diversa. Se ninguém fala não é porque todo mundo esconde, é porque é mentira”, diz Castelfranchi.
- Não compartilhar caso tenha dúvida: “Na dúvida, não passar adiante, pois você também faz parte desse processo”, diz Nabuco.
- Manter-se informado: Nabuco afirma que estar por dentro dos acontecimentos também ajuda a desconfiar e a não cair em informações falsas.
Veja como identificar se uma mensagem é falsa
g1.globo.com/fato-ou-fake/video/como-identificar-se-uma-mensagem-e-falsa-7239543.ghtml
Por Clara Velasco, Gessyca Rocha e Roney Domingos – g1