Voar, voar… subir, subir

Vem aí, o mercado bilionário de veículos voadores urbanos

Em março deste ano, a Eve abriu capital na bolsa de valores de Nova York sob o ticker EVEX. Naquele momento, a subsidiária de mobilidade aérea urbana da Embraer foi avaliada em US$ 2,4 bilhões – praticamente o mesmo valor da fabricante de aeronaves: US$ 2,5 bilhões.

O preço da ação foi estipulado em US$ 10,00 para o IPO. Porém, logo na estreia as ações caíram 23,5%, a US$ 8,66. Desde então, chegaram à mínima de US$ 5,30 e hoje estão cotadas a US$ 7,71.

Para o Santander, a recomendação para as ações da Eve é de compra e o preço-alvo para 2023 é de US$ 10,50 – valor que representa uma valorização de 36% frente ao preço atual. Em relatório, os analistas avaliam que a empresa tem uma “história de alto retorno e alto risco”, quando considerada sua relação com a Embraer.

A visão favorável do banco para os negócios da Eve tem como base três fundamentos:

1) Oportunidade no mercado de mobilidade aérea urbana (UAM), com uma estimativa de mercado de US$ 102 bilhões até 2040 e espaço considerável para crescimento subsequente;

2) Empresas envolvidas com um histórico significativo no setor de aviação (desde a administração, diretoria e investidores), incluindo o conhecimento da Embraer em infraestrutura, propriedade intelectual e engenharia aeronáutica; e

3) Visão de retornos expressivos três vezes maior do que uma visão negativa para o setor.

Para essa “visão”, os analistas simularam cinco cenários diferentes para os principais fatores que envolvem a fase pré-operacional da Eve, como custos de desenvolvimento do eVTOL, demanda pelos “carros voadores”, números da operação até agora e investimentos.

No cenário mais positivo possível, o preço-alvo da ação da EVE chegaria a US$ 16 em 2023. Já no mais negativo, o valor cai para US$ 2,60.

“Acreditamos que o relacionamento da Eve com a Embraer é uma vantagem extremamente importante. A Embraer permitirá à Eve acesso à sua propriedade intelectual, suporte para certificação, acesso à sua infraestrutura global (incluindo o uso em baixa escala de instalações de fabricação) e à equipe de engenharia”, diz relatório do Santander.

Em entrevista à Forbes, André Stein, co-CEO da Eve, confirma a premissa dos analistas do Santander e afirma que isso é um diferencial competitivo que outras empresas que atuam no desenvolvimento de UAM não possuem.

“A vantagem de estarmos associados à Embraer é que não precisamos reinventar a roda. Temos acesso a toda a infraestrutura da empresa, que é uma das melhores do mundo. Além disso, temos profissionais experientes, tecnologia de ponta e estamos em linha com outras empresas mundiais e os principais reguladores do mercado”, diz Stein.

Segundo ele, a abertura de capital garantiu dinheiro suficiente para a Eve dar sequência ao projeto nos próximos anos e trabalhar com o prazo-meta de início das operações em 2026. Em março, o valor que entrou em caixa foi de US$ 512 milhões.

Foto: Eve Air Mobility

“Temos a expectativa de entrada de receita antes de precisar de mais caixa. Nossas receitas não começam só quando o eVTOL estiver em operação no ar. Trabalhamos com o serviço de suporte e controle do tráfego aéreo também”, diz o co-CEO.

A Eve faz parte de consórcios voltados ao desenvolvimento de UAM em outros países, como Austrália e Japão.

O que pode dar errado?

Para o professor de Engenharia Aeronáutica da USP, existem três principais gargalos que podem atrasar a entrega do eVTOL em 2026. O primeiro são as certificações pelas agências reguladoras de aviação, o segundo são os motores à propulsão elétrica e o terceiro, os testes de ruído das aeronaves.

Sobre o primeiro tópico, das legislações, Stein afirma que a Eve e os próprios órgãos governamentais estão engajados no projeto e trabalhando em conjunto para entregar as certificações a tempo.

Em entrevista à Forbes, Roberto Honorato, superintendente de Aeronavegabilidade da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), explicou que a Eve já entregou os primeiros estudos da aeronave para que a agência dê o seu parecer sobre os próximos passos regulatórios.

“Nenhum fabricante chega até nós e fala: fiz um avião, vê se está certo. O fabricante chega até nós com um conceito e estudamos essa base para dar um retorno com critérios de segurança e desenvolvimento. É nesta etapa que o eVTOL está”, diz Honorato.

Segundo o superintendente, a Anac está acompanhando de perto os testes e processos da Eve. Ele explica que não será criada uma regulamentação nova ou certificados novos. Isso seria um processo posterior, para quando o modelo de UAM já estiver em operação.

Honorato afirma que a Anac mantém estudos junto a agências reguladoras internacionais para entender como está o desenvolvimento das aeronaves fora do Brasil. Segundo ele, pela Eve ter o maior número de ordens de compra de eVTOL do mundo, existe essa preocupação de que a certificação da Anac tenha o maior critério possível nacional e internacionalmente.

“O eVTOL envolve novidades tecnológicas que precisamos aprofundar e entender. O motor elétrico é uma novidade e o uso de bateria como fonte de energia traz certa complexidade. A propulsão distribuída com controle por software também é uma questão. Então leva tempo e requer bastante estudo”, diz Honorato.

Os pontos observados pelo superintendente são o segundo gargalo apontado pelo professor Catalano. As baterias elétricas precisam ser de uma voltagem muito alta (800 volts – um carro elétrico, por exemplo, tem baterias de 400 volts), o que traz desafios em relação à recarga, proximidade dos pontos de aterrissagem e capacidade do voo.

Para Stein, isso não é um complicador. “Trabalhamos com tecnologias que já existem. Não é nada novo, não estamos esperando uma solução nova para fazer acontecer. Isso facilita as pesquisas e o andamento do projeto. É uma questão de adaptação.”

Por fim, há a questão dos ruídos. Por voarem em altitudes mais baixas, é importante que as aeronaves não gerem poluição sonora na cidade. “Se a expectativa é ter uma revoada de eVTOLs pela cidade, o ruído tem que ser muito baixo”, diz o professor Catalano.

A questão é tão relevante que a fabricante americana de eVTOLs Joby contou com o apoio da Nasa em seus testes de ruídos. Os resultados foram positivos: a uma altitude de 500 metros, a aeronave atingiu um nível de ruído quase equivalente ao silêncio (45,2 decibéis). Para as aeronaves da Eve, os testes e pesquisas estão sendo feitos na USP.

“Se ocorrer algum atraso, não deve passar de um ano. Está tudo bastante encaminhado. Na engenharia aeronáutica, estamos vivendo os anos dourados em termos de pesquisas e projetos. O eVTOL é o começo”, diz Catalano.

Por Forbes Brasil